A ação de petição de herança pode ser caracterizada como uma medida judicial que protege a qualidade de sucessor. É utilizada quando um herdeiro, excluído da partilha de bens do de cujus, busca obter restituição do quinhão (total ou parcial) que a ele pertence, em face da pessoa que o possua.
Assim, a ação, que encontra respaldo no artigos 1.824 a 1.828 do Código Civil, busca proteger os direitos do herdeiro que, no momento da partilha de bens, era desconhecido, seja por não constar em eventual testamento deixado pelo falecido, seja por se tratar de filho não reconhecido. Apenas por meio dela o sucessor poderá ter seu direito reconhecido.
Para Maria Berenice Dias, a ação de petição de herança é “universal, eis que o autor não pretende a devolução de coisas destacadas, mas sim o patrimônio hereditário por inteiro, por se tratar de herdeiro de uma classe mais privilegiada; de quota-parte, por ser herdeiro da mesma classe de quem recebeu a herança.”
Em tempo, não cabe ao autor da ação provar a propriedade do bem reclamado, uma vez que a ação pode abranger mais do que os bens de propriedade do de cujus. Cabe a ele, contudo, provar sua condição de herdeiro, bem como o fato de o falecido ter exercido posse sobre o bem ali reclamado.
Uma vez reconhecido o autor da petição de herança como herdeiro, o principal efeito da sentença é a nulidade da partilha de bens outrora realizada, visto que um dos herdeiros necessários não fora incluído.
Ainda, são atingidos, com a procedência da ação, o herdeiro aparente (aquele que se encontra na posse dos bens, com todos os seus acessório, e que poderá responder por perdas e danos) e o terceiro adquirente, a depender da forma como o bem fora adquirido. Se adquirido onerosamente e o terceiro apresentar-se de boa-fé, este não ficará obrigado a restituir o bem, devendo o herdeiro que o dispôs, restituir o autor com o valor recebido. Caso o negócio tenha se realizado a título gratuito, o terceiro ficará obrigado na devolução do bem ao autor da petição de herança, ora que inválida a alienação gratuita nesse caso.
Muito se discute sobre o prazo prescricional da ação aqui tratada. Parte da doutrina afirma tratar de ação imprescritível (que pode ser proposta a qualquer tempo), uma vez que a qualidade de herdeiro não se perde.
Assim enxerga o tema Orlando Gomes Sucessões – 12. ed. ver., atual. e aumentada de acordo com o Código Civil de 2002 / por Mario Roberto Carvalho de Faria. – Rio de Janeiro: Forense, 2004, pág. 265):
“No rigor dos princípios, a ação é imprescritível. Ainda que tivesse natureza real, não prescreveria como não prescreve a ação de reivindicação, a que se equipararia. Fosse ação pessoal, também seria imprescritível porque, destinada ao reconhecimento da qualidade hereditária de alguém, não se perde esta pelo não-uso. Busca-se um título de aquisição. Seu reconhecimento não pode ser trancado pelo decurso de tempo. Há de ser declarado passem ou não os anos.”
Contudo, há também o entendimento de que o prazo prescricional é de dez anos, conforme regra geral do artigo 205, CC, sob a justificativa de tratar-se de direito de propriedade. A questão problemática aqui é a definição de quando se daria o termo inicial do decênio prescricional.
Caso o herdeiro seja um filho já reconhecido, discute-se se o início do prazo deve ser a partir da data da abertura da sucessão ou da data da partilha dos bens. Prevalece o entendimento da segunda hipótese, uma vez que apenas então o herdeiro pode ser, de fato, considerado preterido e, a partir de então, poderá ingressar com a ação de petição de herança. Antes da divisão, o herdeiro poderia pleitear seu quinhão apenas habilitando-se na ação de inventário, conforme artigo 682, do Código de Processo Civil.
Entretanto, caso a condição de herdeiro dependa de reconhecimento oficial por ação judicial (como, por exemplo, em uma investigação de paternidade post mortem), decidiu a 3ª Turma do STJ que o prazo prescricional inicia-se com o trânsito em julgado da ação que reconhecer a condição de herdeiro, vez que, antes disso, a parte desconhecia sua condição de herdeiro, não podendo, assim, ser punida com uma prescrição em relação à possível ação de petição de herança (conforme teoria da actio nata – que vincula o início da prescrição ao momento do nascimento da pretensão). Somente então, com a coisa julgada, existiria a pretensão para pleitear o quinhão por meio da ação aqui tratada.
Dessa forma, no caso de filho ainda não reconhecido, o prazo prescricional da ação de petição de herança inicia a partir do trânsito em julgado da ação de investigação de paternidade, conforme entendimento mais recente da 3ª Turma do STJ, que superou o entendimento anterior que tendia a iniciar o decênio prescricional na data da abertura da sucessão. Ainda, uma vez proposta ação que visa reconhecimento da condição de herdeiro, o prazo prescricional deve ser suspenso, voltando a correr apenas com o trânsito em julgado dessa ação, conforme o princípio contra non valentem agere non currit praescriptio (contra quem não pode agir, não corre a prescrição).
Na mesma linha, Silvio Venosa (Direito das Sucessões. – 8.ed. – São Paulo: Atlas, 2008, pág.108), nos ensina: “O prazo extintivo para essa ação inicia-se com a abertura da sucessão e, no atual sistema, é de 10 anos, prazo máximo permitido no ordenamento. No sistema de 1916, o prazo era de 20 anos”.
Tem-se como norteador do tema, a Súmula 149 do Supremo Tribunal Federal, que diz “É imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança”.
Para Sílvio Rodrigues (Direito civil aplicado, volume I, pág. 169), a Súmula induz à ideia de que a ação de status, que é meramente declaratória e não repercute patrimonialmente e, justamente por conta disso, seria imprescritível, uma vez que não interfere na esfera patrimonial dos litigantes, não atingindo, assim, “equilíbrio e a harmonia das relações jurídicas que o instituto da prescrição visa preservar” (ROMANO, Rogério Tadeu).
Destarte, a Súmula 149, do STF, define a imprescritibilidade da ação de investigação de paternidade, mas a prescritibilidade da ação de petição de herança, evitando-se, dessa forma, uma possível discussão patrimonial muitos anos após a data dos fatos que geraram a demanda (isso é, o falecimento do proprietário dos bens).