“Meu irmão é meu herdeiro?” Você sabe como funciona a herança entre irmãos, o que chamamos de “colaterais”? Venha entender melhor!
A ordem de vocação hereditária é um dos temas mais importantes do direito sucessório, e relaciona-se com as pessoas legitimadas a suceder ou herdar. Frisa-se aqui a palavra “legitimidade”, pois é este conceito que caracteriza a quem se transmitirá os bens do morto. Antes de entrarmos no assunto principal deste artigo, algumas conceituações se fazem importantes.
A legitimação sucessória inicia-se com o nascituro, ou seja, aquele que foi concebido, mas ainda não nasceu com vida. Extrai-se referido conceito do artigo 1.798 do Código Civil, que dispõe:
Art. 1.798. Legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão.
Para Maria Helena Diniz, a capacidade sucessória do nascituro apenas se concretiza após o nascimento com vida “havendo um estado de pendência de transmissão hereditária, recolhendo seu representante legal a herança sob condição resolutiva. O já concebido no momento da abertura da sucessão e chamado a suceder adquire desde logo o domínio e a posse da herança como se já fosse nascido, porém, em estado potencial, como lhe falta personalidade jurídica material, nomeia-se um curador de ventre. Se nascer morto, será tido como se nunca tivesse existido, logo, a sucessão é ineficaz. Se nascer com vida, terá capacidade ou legitimação para suceder”[1].
A linha de entendimento de Maria Helena Diniz é a majoritária, que entende que o nascituro apenas terá direitos sucessórios ao nascer com vida, havendo uma condicionante para que ocorra o reconhecimento.
Importante trazer à baila, ainda, a extensão dos direitos sucessórios aos embriões havidos por técnicas de reprodução assistida. A doutrina majoritária entende que o embrião está em situação jurídica diferente ao nascituro, e dessa forma não se pode concedê-los os mesmos direitos. Vejamos o que diz o enunciado 267 do CNJ:
A regra do art. 1.798 do Código Civil deve ser estendida aos embriões formados mediante o uso de técnicas de reprodução assistida, abrangendo, assim, a vocação hereditária da pessoa humana a nascer cujos efeitos patrimoniais se submetem às regras previstas para a petição da herança.
A autora do presente artigo acredita que a concessão de direitos sucessórios aos embriões não deve vigorar, uma vez que eles podem sequer serem implantados ao útero materno. Da mesma forma que estão pendentes a serem gerados, assim ficam também seus direitos; seguindo a linha de pensamento de Maria Helena Diniz e do próprio Código Civil, os direitos sucessórios ficam condicionados ao nascimento com vida.
Levando em consideração que a sucessão testamentária concede ao autor da herança a faculdade de dispor da parte disponível dos seus bens da maneira que melhor lhe convier, tanto o nascituro quanto o embrião poderão ser favorecidos com direitos de herança por testamento. Importante frisar que o artigo 1.798 do Código Civil estabelece regramento quanto à sucessão legítima, uma vez que a testamentária é de livre estipulação.
Aqui não serão trazidos os regramentos da sucessão testamentária, uma vez que esse assunto será tratado em outro artigo. Quanto à sucessão legítima, ocorrerá quando o falecido não deixou testamento ou qualquer outra disposição de última vontade. Versa o artigo 1.829 do CC:
Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;
II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III – ao cônjuge sobrevivente;
IV – aos colaterais.
Art. 1.830. Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.
Nota-se que pela ordem sucessória estabelecida pelo supramencionado artigo, na falta do cônjuge ou companheiro sobrevivente, ascendentes ou descendentes, serão chamados a suceder os colaterais até quarto grau: irmãos, tios, sobrinhos, primos, tios-avós e sobrinhos-netos. Há algumas regras a serem seguidas para que os colaterais herdem.
Primeiramente, na classe dos colaterais, assim como na linha reta sucessória, os mais próximos excluem os mais remotos, salvo o direito de representação concedido aos filhos de irmãos: Dessa forma, os irmãos (colaterais de 2º grau) excluirão os sobrinhos e tios (3º grau); os sobrinhos e tios excluem os primos, sobrinhos-netos e tios-avós (4º grau). Todavia, essa regra não exclui o direito de representação! Se o falecido deixou um irmão e um sobrinho (filho de outro irmão premorto), este terá direitos sucessórios juntamente com o irmão vivo do falecido, representando o premorto.
No caso de concorrência entre irmãos bilaterais com os irmãos unilaterais, cada um destes herdará metade do que cada um daqueles herdar (1.841 CC). Isso quer dizer que, se o falecido deixar um irmão germano e um irmão unilateral, o primeiro herdará 66,66% da herança, enquanto o segundo 33,33%. Zeno Veloso elucida bem esse dispositivo, que causa discussão por conta da igualdade de filiação: “a solução deste artigo se justifica porque, como se diz, o irmão bilateral é irmão duas vezes; o vínculo parental que une os irmãos germanos é duplicado. Por este fato, o irmão bilateral deve receber quota hereditária dobrada da que couber ao irmão colateral”.
De acordo com o artigo 1.842 do CC, se não houver irmão germano concorrendo à sucessão, mas tão somente irmãos unilaterais, esses concorrerão de forma igualitária. Por exemplo, se o morto deixou um irmão uterino e um irmão consanguíneo, cada um receberá 50%. Isso demonstra que irmãos unilaterais não possuem distinção entre si; essa se faz, como mencionado acima, apenas aos irmãos bilaterais com os unilaterais.
Finalizando o regramento, dispõe o artigo 1.843 do CC que, na falta dos irmãos, herdarão os sobrinhos, e, na falta dos sobrinhos, herdarão os tios. Mesmo sendo parentes de mesmo grau, os sobrinhos possuem preferência aos tios na ordem sucessória. Assim como elucidado acima quanto à divisão dos bens entre irmãos bilaterais e unilaterais, estende-se esse regramento aos sobrinhos. Portanto, os filhos de irmãos unilaterais receberão metade do que receberão os filhos dos irmãos bilaterais.
Por fim, não há na lei privada regramento quanto a sucessão dos colaterais de quarto grau, e nem sobre o cenário de primos, tios-avós e sobrinhos-netos bilaterais/unilaterais. Como forma justa, conclui-se que na hipótese de haver apenas esses parentes a concorrerem à herança, receberão entre si cotas iguais (sucessão por direito próprio, vez estarem em mesma linha sucessória).
Confira nosso artigo sobre petição de herança abaixo: https://lem.adv.br/peticao-de-heranca-o-que-e/
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[1] DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 1276
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 9 ed. São Paulo: Método, 2019.